Conheci Ziraldo pessoalmente há quase dez anos, quando ele foi a uma cidade do interior piauiense. Dirigi 90 km para vê-lo e retornei no dia seguinte. A cidade chama-se Oeiras e é bem peculiar. Minúscula, possuía diversas atividades culturais, voltadas à música e à literatura. E nunca dá muita gente, pois se trata de um lugar no meio do nada que nos leva de outro nada a lugar nenhum. Assim, não existe distância entre os ilustres convidados e o público. Foi assim que pude sentar na mesma mesa onde Yamandu Costa ficou arranhando o violão e, estranhamente, depois trocou o instrumento por um toco de madeira e passou o restante da noite sem larga o estranho objeto. Parecia uma espada em sua mão! Estranho? Sim. Foi ali onde também pude estar perto de músicos como Chico César e Geraldo Azevedo e ouvir Ariano Suassuna perguntando por que estávamos bebendo Coca-Cola se tinha cajuína. E foi ali onde conheci finalmente Ziraldo.
Pensei se deveria escrever sobre Ziraldo por ocasião de sua morte. Mas escrever o quê? Não sou um leigo em Ziraldo. Conheço profundamente sua obra, sua evolução gráfica e suas inspirações. O que eu tinha para falar sobre ele não era sobre ele. Vi-o apenas um dia em minha vida e, realmente, separo (dentro do possível) as pessoas de seu trabalho. E sobre seu trabalho, sua obra, já falei bastante, tanto em postagens escritas no blogue anterior e até mesmo em vídeos para o Iu-Toba. Então o que falar neste momento de falecimento do artista? Simples: ele foi o último grande artista gráfico deste mundo. Um gênio do traço e das cores! Em tempos de arte e colorização digitais, não creio que surgirá um novo Ziraldo. Ali era tudo no muque!
Mas Ziraldo era controverso, enquanto mero mortal. Viveu nove décadas de um vidão nababesco. Por ter sido preso alguns poucos dias - apenas detido, sem tortura etc. - recebeu de nós, contribuintes, indenização milionária e embolsava todos os meses "pensão de anistiado", junto com seu amigo Jaguar. Diante disso, Millôr Fernandes (um de seus mestres), afirmou: "Não era ideologia, era investimento", pois via os amigos podres de ricos - com contratos vantajosos com governos federal e estadual, aliás - recebendo a bolsa-ditadura. Malandro é malandro e nós somos os manés que pagam a farra toda.
Ziraldo foi comunista até o final da vida. Mas habitava um apartamento bacana na Lagoa Rodrigo de Freitas e enviou os dois filhos para estudarem e viverem nos Estados Unidos. Vendia a rodo seu material infantil para programas públicos e mesmo assim não sentia pena de sangrar o Erário com sua bolsa-ditadura. Falava em liberdade e democracia, mas desenhou o solzinho do PSOL, que homenageia anualmente regimes como os de Kim Jong-un.
Mas... Ziraldo foi o último grande artista gráfico vivo, o maior cartunista deste mundo. E é isso.
Abraços fúnebres e até a próxima.