quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Enfim, O Fim [ A Liga Extraordinária: A Tempestade ]

Imagem de meu acervo pessoal.

"Edward, vamos dançar?"
- Mina

Meu primeiro contato com As Aventuras da Liga Extraordinária se deu graças à finada Pandora Books. No caso, era uma edição integral, reunindo todos os capítulos da primeira parte da saga, quando o grupo liderado por Mina Harker é formado e, ao final, eles conseguem desmontar a quadrilha do vilanesco Professor Moriarty, o então “M” à frente da inteligência britânica. Destaco que aquele encadernado foi considerado “ilegal” à época, pois, dizem, a Pandora não teria mais direitos de publicação e, mesmo assim, colocou novo material à venda, alegando ter refilado excedente antigo e o reunido em nova capa. Obviamente, isso não colou, pois perceberíamos artifício assim até mesmo devido à numeração de páginas. Mas tanto faz. O próprio Moore é o primeiro a criticar os ganhos das grandes editoras e gritar aos quatro cantos acerca da necessidade em se repartir riquezas. Mas, claro, na cabeça de Mú, a riqueza estaria nos bolsos da classe média que rala todos os dias para quitar carro, financiamentos, planos de saúde e escola particular dos pimpolhos. Mas essa é outra história… Sempre tive um carinho pela Pandora Books e agradeço por cada momento de alegria que ela me deu, inclusive quando publicou seus fascículos, em acabamento canoa com grampos, de Alan Moore's Tomorrow Stories.

Foi inovador ler algo como a Liga: personagens da literatura vitoriana unindo-se contra o arqui-inimigo de Sherlock Holmes. E, no meio de tudo isso, transitamos pelos meandros do serviço de inteligência britânica e um sem número de referências culturais. Isso há dezesseis anos, quando comprei mencionada revista na gibiteria Fênix, em Recife. Hoje, acho que seu nome é mais pomposo: Fênix Geek House. Ao menos, foi esta última a única loja Fênix que encontrei, em Recife, após pesquisas aleatórias.

O segundo volume da saga - quando a ficção marciana começa a se imiscuir na trama com os marcianos de H. G. Wells e o John Carter de Edgar Rice Burroughs - foi igualmente magnífico. Logo, os dois primeiros livros, reunidos tardiamente no Brasil, pela Devir, no mega álbum 1898, representam a melhor fase da saga. O que veio depois não é ruim. Mas passa longe da qualidade das primeiras tramas. Os próprios criadores reconhecem que o caldo desandou nos outros títulos, de certa forma. Assim, ao final de A Tempestade, Moore e O'Neil são os protagonistas do epílogo, onde se veem sem saber o que fazer com a quantidade de entulho acumulada num grande depósito de referências literárias, quadrinísticas, televisivas e cinematográficas durante os últimos vinte anos de produção d’A Liga. Ali, Moore nos diz: “E nós sempre levamos em conta as preocupações dos leitores: quando perceberam que Século tinha um ritmo lento e literário, fizemos a Trilogia Nemo. “Rápida demais e muito leve”, disseram.”. Já  O'Neil concluíra: “Ainda assim, reconheço que deixamos o melhor pro final. A Tempestade foi o proverbial samba do crioulo doido!”. Sim, a A Tempestade é isso: o sumo de duas décadas d’A Liga, inserido a pontapés na saga, para sua necessária conclusão. Contudo, não deixa de ser um bom gibi. Particularmente, gostei de todos. Acompanhei a conta-gotas cada lançamento e não me arrependo. Foi um ótimo tempo empregado. Em A Tempestade, a cultura atinge a entropia e desmorona. Ao menos esta foi minha conclusão pessoal.

Na imagem acima, de meu acervo, só falta o segundo volume do que veio a ser a fase 1898, com a invasão da Terra pelos tripods de H.G. Wells. Não comprei o volumão da Devir e acabei lendo esta história, há anos, em scans. A própria Devir, em 2004, havia lançado esta HQ isoladamente. No entanto, acho que sua tiragem foi tão pequena que sumiu do mapa rapidamente. Então ficará este buraco em minha coleção impressa. Mas tanto faz. Deixei de ligar para isso há algum tempo e me condiciono para, cada vez mais, dar menos atenção ao “ter papel” em minha vida.

Acho curioso que A Tempestade - possivelmente a última obra escrita por William Shakespeare - permeia A Liga desde o início de Século, devido a menções a Próspero, duque milanês. E tudo é concluído com a tempestade trazida ao nosso sistema solar, onde tudo desmoronará. Na dramaturgia, Próspero - figura enganosa, ardilosa e dissimulada - também invoca tormentas para atingir seus fins. N'A Liga, essas tormentas são culturais, onde todas as mais temíveis criações intelectuais esfacelarão nossa História. Outra grande saga dos quadrinhos também encontrou n'A Tempestade sua conclusão: refiro-me a Sandman de Neil Gaiman. Basicamente é isso: nada é novo. Sandman misturou mitologias, religiões, erudições e cultura pop até seu clímax, onde tudo seria repetição, no final das contas. E Alan Moore fez o mesmo.

No blogue anterior havia muitas resenhas sobre esta magnífica obra. Acho que não recuperei nenhuma. E tanto faz. Apenas recomendo que leiam esta saga. Valerá a pena.

Abraços miríficos e até a próxima.

4 comentários:

  1. bela coleção

    um dia vou ler com calma as obras de moore

    vc podia recuperar postagens antigas e colocar na parte debaixo dessa - futuros leitores agradecem


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    1. p.s.: coleções assim são de papel e papel não importa, mas adoro a higiene mental

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    2. Olá, Scant.

      Sempre enalteci e continuo acreditando no prazer tátil que os livros proporcionam. Para nós, mais velhos, o meio impresso mexe até mesmo com percepções sensoriais afetivas ligadas a um sentimento meio nostálgico.

      Felizmente, no Brasil, as editoras abriram os olhos para oferecer edições cada vez mais caprichadas, com apelos tátil e visual. Ex,: DK Books, Martin Claret, Nova Fronteira etc. Mas tudo começou com a Cosac&Naify.

      Contudo, venho, mesmo, evitando comprar papel. Não dá mais. Problemas com espaço, limpeza e organização, além de gastos, impedem. E aproveito para, com isso, ir me libertando da necessidade deste suporte. Há alguns anos, eu jamais leria algo em epub. Hoje, já concluí dezenas de livros e centenas de HQs. Se eu precisassem ter tudo isso em mãos, nem teria como.

      Guardo com carinho tudo o que comprei. Quero zelar por isso. Mas não pretendo, mais, depender afetivamente de publicações impressas. Talvez, mais à frente, consiga até mesmo me desapegar do que guardo.

      Sobre o Moore: merece sempre releituras.

      Abraços!

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  2. Oi, Fabiano.

    O filme é bacana. Gosto dele. Algumas pessoas odeiam. Mas vejo como o que é: apenas um filme de aventura inspirado na hq. Mas, pelo cinema, não temos dimensão do que é esta saga. Passa bem longe, aliás.

    Sobre o segundo volume, já tive várias oportunidade de adquirir. Até mesmo por preços bons. Mas, realmente, não quis. Não quero abrir exceção a esta determinação de comprar menos e estou de boa com isso. Vai que começo a tapar buracos em coleções e retomo o hábito? É igual a alcoólatra.

    Abraços!

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