terça-feira, 10 de dezembro de 2019

Os causos de Eberton Ferreira


Conhecia um pouco do trabalho de Eberton Ferreira devido a postagens avulsas em redes sociais e a um blogue. Gostava de sua abordagem nacionalista de conteúdo e de seu traço. Mas não me envolvi com sua produção até que, novamente, me chegaram algumas indicações: a série Causos, no momento em quatro volumes com gancho para o quinto. Aquilo era tudo o que eu queria em HQ nacional, me remetendo com certa alegria a títulos lidos na infância, logo após o auge de quadrinhos de terror. Entrei em contato com o autor e encomendei os gibis, valendo a pena o investimento. De imediato, destaco o esmero gráfico. O acabamento é canoa, mas com capa e miolo em papel similar ao couché, em elevada gramatura. A arte, em P&B com tons de cinza, ajudaram ainda mais a me levar aos amados gibis da infância: Mestres do Terror, Calafrio e títulos avulsos organizados por caras como Ota, Cláudio Seto e tantos outros.

A grande sacada do autor, penso, foi elaborar convincentes histórias de terror com ressonância emocional, explorando temas que na maioria das vezes, por aí, são meio clichês: o folclores brasileiros. É assim que acompanhamos o investigador/caçador/explorador lusitano Gonçalo e seu cunhado Iberê, nativo, na resolução de crimes bárbaros com nuances ritualísticas em pleno nascimento da terra brasilis. E sobra para todos, sem mea culpa ou abordagens politicamente corretas. Nas tramas, todo homem pode ser o lobo do homem, seja o indígena contra sua própria etnia até sacerdotes brancos e oficiais. O próprio herói nos é apresentado com parcimônia, quando escancara seu passado de desbravador cruel, a mando da Coroa, passando por cima de tudo e, inclusive, estuprando nativas - conquanto venha a se casar com uma, após mais “redimido” e resignado em consumar seus dias vindouros no novo e selvagem mundo.

Além do estilo próprio numa arte que realmente me agrada, bons textos e acabamento decente, Eberton sabe narrar uma história. Sua pesquisa é profunda e as licenças encontradas para explicar as ocorrências sobrenaturais que se tornaram nosso folclore revelam perspicácia. Sentimos, lendo os causos, como são palpáveis e verossímeis as “entidades” a exemplo do Curupira, Cuca, Boto ou a mística por trás do fruto guaraná. De certa forma, o autor desmistifica e desmitifica mitos. Nesta empreitada, invés de lhes destituir da poesia, acaba por torná-los ainda mais sedutores. Outro aspecto merecedor de nota em seus quadrinhos é o uso, com felicidade, de recurso narrativo similar ao flashback no início de cada número. A trama sempre inicia-se mais adiantada e, então, retornamos aquele ponto mais à frente. Vale destacar a amarração entre cada número: tudo é conectado, sem brechas e pontas soltas. Quem conhece este blogue sabe, ainda, meu interesse por magia (não sou praticamente, mas curioso), algo nuclear às tramas.

Fico feliz pela realização desse artista nacional que elabora quadrinhos nas horas vagas, quando não está vendendo seus espetinhos (o cara é churrasqueiro, salvo engano). E, com bastante esforço e paciência, hoje, colhe os frutos do reconhecimento. Como gostei bastante de suas revistas, encomendei as duas especiais de A Rede da Carne, pois recordo quando ele divulgava, aos poucos, algumas artes destas tramas. Sei que, ali, encontrarei bons momentos de entretenimento.

Quem quiser adquirir os quatro número de Causos, pode fazê-lo por WhatsApp (21 96736-1309). Até o momento, temos: #01 O Demônio das Matas, # 02 A Bruxa da Floresta, #03 O Devorador de Almas e #04 O Monstro do Rio, pelo selo independente FazinesTon. Sim, o “Ton” de Eber-Ton. Cada edição custa R$ 20,00 e os números de páginas vão de aproximadamente 50 a 100.

Fico por aqui. Abraços folclóricos e até a próxima.

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