segunda-feira, 8 de julho de 2019

Livros, sebos e leitura digital

Photo by Min An from Pexels
"Corso era um mercenário da bibliofilia, um caçador de livros por conta de outros. Isso inclui os dedos sujos e o verbo fácil, bons reflexos, paciência e muita sorte. Também uma memória prodigiosa, capaz de recordar em que canto poeirento de um sebo dorme aquele exemplar pelo qual pagam uma fortuna. sua clientela era seleta e reduzida: uma vintena de livreiros de Milão, Paris, Londres, Barcelona ou Lausanne, dos quais só vendem por catálogo, investem sem risco e manejam mais de meia centena de títulos de cada vez, aristocratas do incunábulo, para os quais o pergaminho ao invés do velino, ou três centímetros a mais na margem da página, supõem milhares de dólares. Chacais de Gutenberg, piranhas das feiras de antiguidade, sanguessugas de leilões, são capazes de vender a mãe por uma edição príncipe; mas recebem os clientes em salões com sofá de couro, vista para o Duomo ou o lago de Constança, e nunca mancham as mãos, nem a consciência. Para isso servem os tipos como Corso."
O trecho acima retirei de meu exemplar de O Clube Dumas de Arturo Pérez-Reverte, a melhor (ou única!) obra que li acerca de mercado livreiro. Na verdade, o cerne de toda a obra é justamente a negociação de obras impressas raras e manuscritos. Trama magnífica, dinâmica e bem amarrada, foi adaptada para o cinema num trabalho "marromenos" de Roman Polanski com Johnny Depp no papel principal (The Ninth Gate ou O Último Portal, de 1999). Achei bacana transcrever a passagem acima porque mantem total relação com esta postagem, a qual traz sugestão de documentário, ao final, e algumas considerações pessoais acerca de livro físico e leitura digital.

Gosto bastante de sebos, bibliotecas e livrarias físicas. Fazia postagens a respeito no blogue anterior e, recentemente, fiz algo similar aqui quando comentei o livro A Biblioteca: Uma História Mundial e mostrei minha atual mini biblioteca após mudança de residência. Esses ambientes, contudo, vão ficando cada vez mais apenas na memória, à medida que livrarias fecham e sebos só se mantém em pé no meio eletrônico, mesmo assim não praticando bons preços e superestimando livros ditos raros que, no máximo, andam meio esgotados. Outro grande problema é o estado de qualidade, de conservação. Já topei com volumes caindo aos pedaços, sem sobrecapa e riscados sendo vendidos por preços extorsivos porque o pseudo Mercador de Livros o elevou ao status de raridade. Coisas do Brasil, creio, onde tudo é caro.

Gosto do pequeno documentário realizado pela Estácio sobre livreiros de usados: Sebos & Sábios. Havia recomendado no site antigo e, agora, vendo que não republiquei a postagem, aproveito para fazê-lo. Certamente não concordo com todo o afirmado pelos profissionais entrevistados. No entanto, o documentário ficou bacana e, no Youtube, não encontro nada similar de melhor qualidade. Por mais que andem numa fase esquisita, sebos são locais pelos quais cultivo certo carinho. Confesso não gostar tanto da palavra sebo. O português lusitano com seu "alfarrabista" é mais interessante. Ou até mesmo somente "livraria de usados, raros ou antigos". Dizem que sebo derivaria do inglês SEcond hand BOok ou do engorduramento em capas de livros usados quando da leitura, no passado, sob luz de vela. Certeza acerca da origem, ninguém possui. Ainda penso que a palavra foi escolhida, deveras, por sua conotação aviltante e nada mais. Se não escolhida, mantida por este motivo.

Há algum tempo venho equilibrando meu prazer pela leitura entre o suporte tradicional de papel e o meio eletrônico. Tudo começou quando ganhei de presente o Kobo Glo de alguém especial. Meio torci o nariz de início, mas me apaixonei aos poucos pela praticidade e economia. Poder ler à noite, com as luzes apagadas, aumentando fontes e margens, é mais que bem vindo na minha idade onde a visão cansa. Para HQs, utilizava tablet com 9.5", o qual me vi coagido a deixar definitivamente com minha filha, de tanto ela pedir e não largá-lo mais. Assim, comprei outro com 10.5" e afirmo: é maravilhoso para ler quadrinhos.

Fui alguém que comprou muitos livros em livrarias. Algumas pessoas mais jovens até sorriam. Um estagiário em meu serviço chegou a zombar porque eu comprava em livraria física, mais caro, ao invés de apenas em lojas on line. Tentei lhe explicar o prazer que sentia ao estar numa livraria, pequena ou megastore, folheando livros e tomando café e, finalmente, sair com algo em mãos. Eu, realmente, fiz minha parte pela sobrevivência do setor, dentro de minhas limitações e possibilidades. Mesmo sendo um consumidor para o qual as editoras e corporações livreiras sequer prestavam atenção, estava lá, torrando grana  por meu prazer mais íntimo, pro meu deleite pessoal e, claro, porque sabia que, sem um público parecido comigo, tudo aquilo acabaria. O tempo mostrou que tais negócios não se sustentavam mais, amiúdes.

Em suma, curtam o documentário a seguir e abraços.








13 comentários:

  1. Nunca usei nenhum desses "e-reads", até tive curiosidade. Passei boa parte do meus 11/15 anos, em sebos. Não fui tanto em livrarias, por geralmente achar o preço caro, e às vezes o lugar muito riquinho. Após anos de leitura de gibis no PC, cheguei a ter akhuns tablets, mas sem dúvidas o que tenho hoje de 10 polegadas da Samsung vale 4x o que paguei nele, facilitando em muito minha leitura, só gosto de ler no escuro. Ademais, tá lendo algum gibi digital atualmente? Não sei se lhe recomendei Fury do Garth Ennis+Goran Parlov, são 13 edições. Recentemente saiu o novo trabalho deles, o Justiceiro - O Pelotão, ainda não li, mas deve ser excelente também.

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    1. Não havia recomendado, mas agora está.
      Sobre leitura atual de HQs digitais, estou sempre lendo. Praticamente todos os dias leio alguma HQ curta, inclusive MSP fase Abril ou algo Disney, ou entro em alguma série. Ontem mesmo acessei um link de As Crianças do Crepúsculo para iniciar logo a leitura. Tb sempre estou vendo algo de HQ nacional antiga.
      Com o tempo, as livrarias tiveram tanto capricho nas decorações que pareceram mesmo meio elitizadas. Mas sempre topei com todo o tipo de gente lá. Inclusive eu mesmo que só ando de camiseta regata e sandálias. rs
      Abraços!!!

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  2. lembrei do filme Velvet Buzzsaw

    "o pseudo Mercador de Livros o elevou ao status de raridade." - isso acontece direto comigo, fico rindo quando encontro a mesma obra de graça no "Le Livros" ou em outras fontes, como o scridb

    "Sebos & Sábios" - na lista

    "Kobo Glo" + "10.5"- também comecei por ele, mas agora só kindle. O tablet é perfeito também para ler pdfs de livros

    "folheando livros e tomando café" - creio que a gratidão pelo prazer da experiência justifique gastar algumas dezenas de reais a mais na hora e não ter que esperar frete e outras burocracias

    abs!

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    1. Vi o filme no lançamento pela Netflix. Bem lembrando e muito bem colocado em complemento a esta postagem.

      Sobre "pelo prazer da experiência"... afinal, e para que serviria o dinheiro, não é mesmo?

      Abraços, meu grande!

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    2. Ah, não sei se percebeu, mas estarei colhendo imagens com crédito do Pexels, igual a vc.

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    3. percebi. adoro o Pexels: gratuito, com boas imagens (algumas excelentes) e sem afetar os direitos autorais

      abs!

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    4. Pois é. Comecei a preocupar bastante com direitos de imagens soltas aleatoriamente na web...

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    5. já tem um tempo que me preocupo com isso

      normalmente uso o pexels ou tiro eu mesmo a fotinha

      mas tem alguns casos que não tem jeito, como posts sobre:

      - fotógrafo famosos
      - imagens raras que se relacionam com o objeto post (lembro que vc tinha no blog antigo uns posts legais sobre belas bibliotecas de famosos)
      - reproduções de páginas de livros (às vezes o design ou layout do esquema criado pelo autor é tão especial que não tem sentido mencioná-lo sem reproduzir a criação)
      - cartazes de filmes

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    6. e não há segurança jurídica:
      http://obrasintelectuais.com.br/pequenos-trechos/

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    7. https://br.blog.wordpress.com/2016/04/05/cuidados-com-direitos-autorais-na-producao-de-conteudo/

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    8. Art. 46. Não constitui ofensa aos direitos autorais:

      I - a reprodução:

      a) na imprensa diária ou periódica, de notícia ou de artigo informativo, publicado em diários ou periódicos, com a menção do nome do autor, se assinados, e da publicação de onde foram transcritos;

      b) em diários ou periódicos, de discursos pronunciados em reuniões públicas de qualquer natureza;

      c) de retratos, ou de outra forma de representação da imagem, feitos sob encomenda, quando realizada pelo proprietário do objeto encomendado, não havendo a oposição da pessoa neles representada ou de seus herdeiros;

      d) de obras literárias, artísticas ou científicas, para uso exclusivo de deficientes visuais, sempre que a reprodução, sem fins comerciais, seja feita mediante o sistema Braille ou outro procedimento em qualquer suporte para esses destinatários;

      II - a reprodução, em um só exemplar de pequenos trechos, para uso privado do copista, desde que feita por este, sem intuito de lucro;

      III - a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra;

      IV - o apanhado de lições em estabelecimentos de ensino por aqueles a quem elas se dirigem, vedada sua publicação, integral ou parcial, sem autorização prévia e expressa de quem as ministrou;

      V - a utilização de obras literárias, artísticas ou científicas, fonogramas e transmissão de rádio e televisão em estabelecimentos comerciais, exclusivamente para demonstração à clientela, desde que esses estabelecimentos comercializem os suportes ou equipamentos que permitam a sua utilização;

      VI - a representação teatral e a execução musical, quando realizadas no recesso familiar ou, para fins exclusivamente didáticos, nos estabelecimentos de ensino, não havendo em qualquer caso intuito de lucro;

      VII - a utilização de obras literárias, artísticas ou científicas para produzir prova judiciária ou administrativa;

      VIII - a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores.

      Art. 47. São livres as paráfrases e paródias que não forem verdadeiras reproduções da obra originária nem lhe implicarem descrédito.

      Art. 48. As obras situadas permanentemente em logradouros públicos podem ser representadas livremente, por meio de pinturas, desenhos, fotografias e procedimentos audiovisuais.

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    9. Boa informação. Eu nunca tinha pesquisado bem a respeito do tema...

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