sábado, 18 de junho de 2022

Eu era um lobisomem juvenil


Exemplar de minha coleção.

Creio piamente que Arma X é a melhor história escrita com/para Wolverine e até hoje gosto de relê-la ou ao menos sempre vale a pena folheá-la para apreciar a arte exuberante de Barry Windsor-Smith, o gênio da nona arte que adaptou Conan para os quadrinhos e, no caso de Arma X, também escreveu a história, selecionou as tintas que seriam utilizadas na colorização e ainda tentou dar conta do letreiramento original.

Sempre insisto que Wolverine é um personagem subaproveitado pela Marvel. Sua imagem agressiva, as ações sem fim que proporciona e o impacto das garras rendem bastante grana, vendendo até mesmo lixo. Mas falta algo. Falta alguém colocar as mãos na massa e escrever algo verdadeiramente significativo para o canadense enfezado. Como seria isso? Não sei. Se soubesse, venderia à editora. Mas seria algo similar ao que Barry Windsor-Smith fez em Arma X, só que focando num Logan em si, seu passado "humano", seu cotidiano enquanto membro de uma super equipe uniformizada com collant espalhafatoso, talvez um possível futuro factível, seus dramas e desafios mais íntimos e sombrios. E tudo isso de maneira concatenada: uma saga.

Arma X é uma história perfeita por tudo: arte magnífica, roteiro impecável - onde muito é apenas sugerido ou indicado, exigindo do leitor atenção e até mesmo repaginadas para esclarecer melhor situações -, profundidade (embora não de personagens, mas de situações) e tudo mais o que compõe esta plataforma de mídia que chamamos de gibi, quadrinhos ou mais pomposamente de graphic novel.

Conheci o personagem folheando revistas de meu irmão mais velho. Mas a primeira que comprei em banca, com meu dinheiro, foi Wolverine n° 36, em fevereiro de 1995. Mas a vida de leitor de quadrinhos era difícil e, para continuar seguindo o título, não deu. Ainda mais quando a Abril botava em banca um gibi como Wolverine n° 39, custando R$ 0,30 a mais porque optaram, naquele número, por papel LWC e uma capa mais grossinha, com efeito (era rasgada pelas garras de Logan!). Eu também tentava acompanhar X-Men desde o n.º 72 (1994), mas também parei porque sempre surgia algum outro gibi que queria comprar. Recordo também de ver Wolverine Extra n° 01 nas mãos de algumas pessoas, reunindo todas as partes de Arma X num formatinho com lombada quadrada. Checando no Guia dos Quadrinhos, vi que custava R$ 2,80, o que era muita grana naquela época para apenas 132 páginas em papel jornal.


Para mim, a arte de Windsor-Smith em Arma X foi revolucionária dentro do gênero.

Como sempre, comecei escrevendo este post com algo em mente: expor porque Arma X é um gibi realmente perfeito e, agora, já desandei para outras divagações. Mas tudo dentro do mesmo tema: quadrinhos. Desde que me entendo por gente, por ser pensante que sabe que pensa, descobri as delícias da solidão na leitura. Pouca coisa me dá tanto prazer, até hoje, como ler. É a forma de arte que mais me apetece. E, seja nos momentos mais felizes ou sombrios da minha vida, é na arte onde encontro guarita.

Quando eu tinha em torno de nove ou dez anos de idade, pulei de cima do guarda-roupas de meu quarto, para a cama, acreditando piamente que poderia ser igual ao Homem-Aranha. Se ele podia, eu também poderia, mesmo sem picada de aranha radioativa. Evidentemente me estatelei todo (e no chão) e passei dias dolorido em várias parte do corpo. Felizmente, não quebrei nada. Quando me perguntaram o que aconteceu, menti que cai tentando pegar algo sobre o móvel. A vergonha era grande demais para assumir. Lembrei deste fato relendo algumas histórias (para mim, clássicas) do cabeça de teia, especialmente as escritas e desenhadas por Todd McFarlane - muitos o odeiam, mas não sei o porquê, embora creia que talvez porque ele soube ganhar bastante bufunfa num mercado cruel. E como é bom rever estes quadrinhos e retornar a toda aquele universo mágico perdido. Ainda hoje, há bastante graça nestas leituras. Mas o bom sentimento está justamente nisto: a evocação dos tempos idos. O próprio Todd McFarlane, aliás, andou reconhecendo há pouco tempo como os quadrinhos andam em bancarrota e boa parte disso graças à lacração desenfreada: ausência de sintonia com o público majoritário. E foi atacado por isso. Veja bem: McFarlane é o cara que, ao invés de lacrar com um Homem-Aranha negro, criou um personagem negro campeão de vendas: Al Simmon, o Spawn. É como Frank Miller, constantemente atacado pela turma woke quando, também em vez de produzir mantras vazios, deu à luz uma das maiores heroínas negras de nossa história: Martha Washington.

E ainda falando em Miller, há algum tempo ele ficou de fora de um evento de quadrinhos porque uma cidadã chamada Zainab Akhtar bateu o pé: "se ele participar, não participarei". De acordo com essa jovem senhora, Miller é um reacionário conservador islamofóbico ou algo assim, ainda mais devido ao gibi Holly Terror (tenho na estante, é bonito, bobo e divertido de tão ruim; realmente, trata-se de uma péssima história realizada às pressas e é algo totalmente desnecessário à estante de qualquer leitor). E quem é Zainab Akhtar? Não sei. Nunca vi seu trabalho a fundo. Do pouco que vi, pareceu ser apenas mais uma inútil que nada acrescentou à arte e à cultura. Não passa de autora bosta com quadrinhos grotescos. E bastou ela chorar as pitangas no Twitter que sabotaram um artista do naipe de Frank Miller. Este, aliás, não precisa provar mais nada ao mundo e, ainda vivo (mesmo que em frangalhos), deixou grande legado à nona arte. Miller é um daqueles casos raros de exímio quadrinista puro: se destacou na arte e na escrita, na concepção integral de todo um gibi de cabo a rabo.

O mundo dos quadrinhos anda assim: ignorantes e improdutivos ditando as regras. Costumo dizer que qualquer pessoa com dois neurônios passa longe das atuais publicações mainstream. Até em nichos mais autorais o fedor subiu à estratosfera. Nas poucas vezes que tentei ler algo mais autoral, quebrei a cara, gastando grana à toa e perdendo tempo. Cito, por exemplo, Tetris de Box Brown (2020) e Fun de Paolo Bacilieri (2021). É tudo ruim. Até podemos encontrar algo razoavelmente bom, mas gastamos tempo valioso chafurdando no lodaçal, quando podemos dedicar nosso tempo à leitura e à releitura de caras como Frank Miller, que dificilmente decepcionam. E, mesmo quando fazem lambança, nos divertem.

Esses dias andei lendo O Espetacular Homem-Aranha por David Michelinie e Todd McFarlane, a edição omnibus da Panini. Como é bom rever a arte de McFarlane naqueles gibis que, quando guri, li. Quando comecei a efetivamente comprar gibis DC/Marvel com meu dinheiro (lia mais devido a meu irmão mais velho - o qual, aliás, voltou a ler gibis este ano, perto dos quarenta e cinco anos de idade), Jim Lee e McFarlane eram os caras. Os roteiros nos chamavam a atenção, certamente. Mas a arte era o chamariz. Ainda hoje guardo com carinho X-Men Anual n.° 02 da Abril (1995), com "100 páginas imperdíveis", o qual foi lido e relido e me deu diversas horas de alegria, me deleitando com a arte de Lee, bonita até no formatinho. Aliás, o primeiro gibi que comprei dos mutantes foi no final de 1994. Sei disso porque se tratava do número 73. Guardei a revista bastante tempo, até perdê-la numa mudança.

Conquanto alguns puristas teimem em detratar e destratar McFarlane, sua atuação no roteiro do Aranha foi excelente, ao menos para mim. Ele era apenas desenhista do título O Espetacular Homem-Aranha. Então veio a proposta de, além deste título, outro ser publicado concomitantemente, apenas como "Homem-Aranha", e foi McFarlane que encabeçou os primeiros números com histórias que se fechariam brevemente, como a clássica Tormento. Mas uma me encantou desde guri: Subcidade (Abril, n.º 144, ano de 1995). Mendigos estão sendo mortos por ignaros seres habitantes dos esgotos. Com o tempo, descobrimos que agem assim a mando de Morbius, que atua como um Rei no submundo, pedindo aos pobres-coitados que catem "malvados" na superfície para saciar sua sede por sangue. Só que aqueles seres bobalhões não sabem o que seria um "malvado". Para eles, qualquer pessoa acima dos esgotos é má. São pessoas rejeitadas pelo mundo, desfiguradas e embrutecidas de tantas décadas de reprodução consanguínea. Não deixa de ser tocante, enquanto assombrosa. E McFarlane não poupava esses detalhes, como o incesto nos esgotos. Assim como vemos pessoas cheirando pó nas ruas imundas da grande metrópole ou até mesmo um Peter Parker tarado em viver transando com sua esposa gostosa. Ah, e a Mary Jane de Todd McFarlane mexia com a(s) cabeça(s) da gurizada...

Não reproduzia a beleza de Zendaya, mas dava pro gasto...

Sobre edições omnibus, não gostei da experiência em lê-las. São trambolhos desconfortáveis para manusear, ainda mais para mim, que leio deitado há alguns anos. São volumes que ficam bonitos na estante, sem dúvidas. E é interessante poder compendiar fases de artistas e escritores, longos arcos e sagas, em apenas um volume. Mas, realmente, não rola para mim. Pretendo nunca mais comprar edições tão volumosas.  Acho que 150 (talvez no máximo 200) páginas por volume já está de bom tamanho. Se for cuchê, devido ao peso, 150 páginas já representa uma peleja para o manuseio.

Fico por aqui. Abraços juvenis e até a próxima.

15 comentários:

  1. Barry Windsor-Smith é um de meus artistas prediletos,
    a ultima coisa q li dele foi O Anel do Nibelungo
    os quadrinhos perderam o rumo
    engracado, mas parece q a decada de 90 foi a ultima decada nao lacradora demais

    abs!

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    1. Não sabia que ele havia adaptado essa obra para os quadrinhos. Vou pesquisar a respeito e procurar scans!
      Acho que celebram tantos os anos 90 nos quadrinhos justamente por isso: porque depois disso foram ocupados pela turma woke que nunca gostou mesmo de HQs, mas precisa se infiltrar em todos os nichos para ocupar e destruir.
      Abraços!

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    2. erro meu, confundi com p graig russell

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    3. Pesquisei e vi que saiu um volume pela P&N. Parece bonito!!!

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  2. Rapaz, deu uma puta nostalgia lendo esse seu texto. Tenho todos os gibis que aparecem nas fotos. Por onde anda Barry Windsor-Smith? Ele é o fodão dos fodões. E gostei muito do que disse : "McFarlane é o cara que, ao invés de lacrar com um Homem-Aranha negro, criou um personagem negro campeão de vendas: Al Simmon, o Spawn. É como Frank Miller, constantemente atacado pela turma woke quando, também em vez de produzir mantras vazios, deu à luz uma das maiores heroínas negras de nossa história: Martha Washington."
    Os lacradores são seres totalmente desprovidos de talento, que vivem de destruir o que mestres fizeram, por pura inveja. Até quando a arte se curvará aos lacradores? Até o momento em que ela deixará de ser arte?
    Coincidência ou não : até escrevi um pequeno poema a respeito disso um dia desses, vou ver se publico.
    Em tempo : a Mary Jane do McFarlane é gostosíssima!

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    1. Os lacradores querem destruir.
      "O mal não pode criar nada de novo, só pode corromper e arruinar o que as forças do bem inventaram ou fizeram" (Tolkien).
      Windsor-Smith anda há anos num ostracismo voluntário. Salvo engano, mais envolvido com seus projetos artísticos além dos quadrinhos, valorizando seu talento para si, e não para grandes empresas como a Marvel.
      Rapaz, vc guarda seus formatinhos com carinho, então. Posta algo a respeito qualquer dia.
      Abraços!

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    2. Estou há algum tempo com um texto na cabeça para falar dos formatinhos, mas ando numa preguiça sem tamanho de escrevê-lo. Mas vai acabar saindo, logo, logo.

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  3. Nunca fui de ler muitos quadrinhos quando jovem. Quando eu tinha meus 8-15 anos, os quadrinhos já estavam em bancarrota por aqui, creio. Em 94, por exemplo, quando você comprou esse gibi, eu nem era nascido.
    Comecei a ler quadrinhos só mais velho, por volta de 22 anos, mas lia mais quadrinhos não relacionados a super-heróis. Até tentei ler alguns, mas acho que os supers não me apeteciam mais. Li Batman Ano um, o cavaleiro das trevas, charada mortal e foi só, creio (gostava do Batman, por ele ser mais "humano"). Gostava das estórias do Demolidor também, mas nunca acompanhei realmente. Me falta ler A Queda de Murdock, que dizem ser muito boa.
    "E, seja nos momentos mais felizes ou sombrios da minha vida, é na arte onde encontro guarita."
    Também tenho essa relação com a arte, de usar pra internalizar dores e passar o tempo. Acho que a leitura foi um dos melhores amigos que encontrei, nos momentos em que mais estive triste, depressivo e só. De alguma forma, os problemas parecem passar quando estou lendo algo bom de maneira concentrada.
    Abraços!!

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    1. Com logo após os 20 anos é que voltei a ler quadrinhos. Na verdade, até relia alguns que ainda guardava. Mas não comprei nada entre o final de meus 15 anos até 20 e poucos. E há uma explicação. Com 16 anos ingressei na faculdade e não lia nada além de livros acadêmicos e romances e crônicas. Parecia uma postura "madura" de minha parte, agir assim. Não sei o motivo exato.
      Mas, findo o curso, voltei a ler hqs e descobri um monte de material autoral interessante. E fiquei afastado de herois na maior parte do tempo. Depois, esse material autoral foi se mostrando mais do mesmo e sempre com uma mesma pauta. Então aproveitei para voltar para os heróis. Mas, como não gostei do que vi, fiquei conhecendo coisa do passado que desconhecia e relendo outras coisas.
      A arte salva vidas!
      Abraços!!!

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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    1. Isso do preço procede. Uma edição volumosa em regra sempre sairá mais em conta do que várias fracionadas. Afinal, é só uma capa, só uma distribuição, só uma produção editorial etc. Mas, para economizar mesmo, ando preferindo scans. kkkk
      Abraços!!!

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  5. já viu isso?

    http://rockquadrinhosscans.blogspot.com/2023/01/album-de-figurinhas-quadrinhos-de-nho.html

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    1. https://rockquadrinhosscans.blogspot.com/search?q=Vaca+Cinza

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    2. Conheço o blogue há tempos e até já baixei muito de seu conteúdo. Mas esses posts dos álbuns de figurinhas, nunca vi!!! Agora recordo bem que, quando eu era guri, havia álbum de figurinha de tudo quanto é bobagem, para crianças e adultos. Sem diversões eletrônicas e acesso fácil a conteúdo, tudo encontrava seu lugar no mercado.

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    3. Mas percebi que é ali é álbum amador. Um cara que curte fazer essas coisas, como revival de seus bons anos. Parece interessante.

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